BIBLIOFILIA - VI

 O que torna uma obra valiosa?

Texto de Bira Câmara

Um livro velho não é valioso só porque é antigo ou mesmo ra­ro. O que o torna valioso é a sua procura.
Milhões de livros antigos estão espalha­dos pelo mundo, mas não têm nenhum valor por­que não interessam a nin­guém. Um conjunto de fatores e de caracterís­ticas é que faz com que uma obra seja dese­jada e procu­rada por muita gente. Não há regras ou critérios rígidos para que ela seja considerada valiosa, mas, ge­ral­­mente a primeira edição de uma obra célebre quase sempre adquire es­se status. Se um livro foi ignorado em seu lançamento, não tem impor­tância his­tó­rica e nin­guém mais lê, não vale nada.

Às vezes um livro é procurado não por causa da qualidade literária, mas porque foi impresso por um tipógrafo célebre, porque contém ilustrações de algum artista reno­mado ou até por algum erro de impressão engraçado.

A Bíblia de Gutemberg, o primeiro livro impresso no mundo, é o mais caro que existe. Mas não é tão raro assim, pois existem quarenta e dois exem­pla­res dele. Outras edições posteriores também ficaram valo­rizadas devido a vários motivos, mas nenhuma é tão curiosa como a edição inglesa de 1631. É que um tipógrafo gaiato, ao imprimir o sétimo mandamento, “não cometerás o adul­tério”, omitiu o “não” e saiu im­presso: “Thou shalt commit adultery”! Por causa disso, toda edição foi quei­mada com medo que os crentes não perce­bessem o erro e seguissem o man­da­mento da forma como tinha sido im­presso. O tipógrafo foi multado em trezentas libras, uma pequena fortuna na época. Apesar de destruída, esca­param quatro exemplares da obra.

Há casos divertidos, como o livro de um autor brasileiro do século dezenove, ignorado hoje em dia: Valentim Maga­lhães. Apesar de não ter deixado ne­nhu­ma obra prima ou ter qualquer impor­tância na história da literatura, um de seus vários livros despertou o in­te­resse de muitos bibliófilos. O seu roman­ce Flor de Sangue, publicado em 1897 por Laemmert, saiu com uma errata que diz: “à página 285, quarta linha, em vez de ­– estourar os miolos – leia-se cortar o pescoço.”

Casos assim são abundantes e não há bibliófilo, colecionador ou livreiro que não conheça algum. 

(Fonte: Rubens Borba de Moraes, O Bibliófilo Aprendiz, Cia Ed. Nacional, 2ª Ed., 1975)

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